- Fernando Henrique
Anne Frank - Reflexões em tempos sombrios
"Vejo-nos aos oito, aqui no Anexo, como se fôssemos um pedaço de céu azul rodeado por ameaçadoras nuvens negras. O local perfeitamente circular onde nos encontramos ainda é seguro, mas as nuvens estão a avançar sobre nós, e o anel que nos separa do perigo que se aproxima é nossa busca desesperada de uma saída, vamos constantemente de encontro uns aos outros. Olhamos para a guerra por baixo de nós e para a paz e beleza por cima. Entretanto, fomos isolados pela massa escura de nuvens e não podemos subir nem descer. Esta ergue-se à nossa frente como uma parede impenetrável, tentando esmagar-nos, mas ainda sem o conseguir. Posso apenas gritar e implorar:
-- Oh, anel, anel, abre-te e deixa-nos sair
Tua, Anne"
Relato extraído do livro "O Diário de Anne Frank: Versão Definitiva" pela Editora Livros do Brasil, 2015

Anne Frank e sua família juntamente a um outro grupo de judeus permaneceram escondidos por dois anos em um "Anexo" que ficava "camuflado" atrás de uma prateleira de livros. A ideia do Anexo surgiu de seu pai (Otto Frank), que percebendo a ocupação nazista em Amsterdan e tendo seu visto negado pelos EUA, percebe que a situação dos judeus a partir da ascenção de Hitler estava tomando contornos dramáticos e que toda a sua família poderia ser deportada a qualquer momento para os campos de concentração na Polônia.

O sinal vermelho ocorre no momento em que sua filha mais velha (Margot Frank) recebe uma intimação do governo para se apresentar e ser deportada. A partir desse momento, ele não tem mais dúvidas, e toda a sua família foge para o Anexo, porém sem malas, apenas com as roupas do corpo e alguns poucos utensílios indispensáveis, pois não podiam chamar atenção.
Anne dedicou boa parte do seu tempo no "Anexo" a escrever um Diário e já naquela época acreditava que seus escritos poderiam ser úteis como relato histórico para o desenvolvimento e conscientização da humanidade. Relato de uma sinceridade excepcional, o diário explora questões complexas como sua conturbada relação com sua mãe, sua sexualidade latente, seus sentimentos de horror causados pela guerra, a sensação de claustrofobia, a impossibilidade de ter um espaço só seu, o medo da morte e ainda a esperança em um mundo melhor.

Infelizmente, o Anexo foi descoberto no dia 4 de agosto de 1944, todas as oito pessoas escondidas foram presas e deportadas para campos de concentração. Anne Frank morreu no campo de concentração de Bergen-Belsen faltando apenas dois meses para o final da guerra na Europa. O único sobrevivente do grupo foi seu pai, que anos depois viria a autorizar a publicação do diário de sua filha.

Abaixo mais um trecho do diário, que parece dialogar tanto com o momento presente:
"Nesse momento não penso em toda miséria, mas na beleza que ainda resta. O conselho dela (minha mãe) face à melancolia é: pensa em todo o sofrimento que há no mundo e dá graças por não estares a passar por ele. O meu conselho é: Sai para a rua, vai ao campo, aprecia o sol e tudo o que a natureza tem para oferecer. Sai e tenta recapturar a felicidade que EXISTE dentro de TI próprio, pensa em toda a beleza que há em ti e em tudo o que te rodeia, e sê feliz. Se nos tornarmos parte do sofrimento, o que nos resta? Ficaríamos completamente perdidos. Pelo contrário, a BELEZA PERMANECE, mesmo na desgraça!"
ANNE FRANK
Relato extraído do livro "O Diário de Anne Frank: Versão Definitiva" pela Editora Livros do Brasil, 2015
A Netflix também acaba de lançar o documentário de origem italiana "Anne Frank – Vidas Paralelas" no qual relaciona a vida de Anne Frank e os relatos do seu diário a outras cinco mulheres que conseguiram sobreviver ao holocausto.